Opinião: Esquecer é preciso

Imagem: Ilustrativa | La Parola
Por Sergio Marcone Santos
No mundo inteiro pessoas têm recorrido à justiça pelo direito de ter suas histórias deletadas em sites da internet.

Mas estes pedidos não estão limitados somente ao que está na web. Hoje, pode-se exigir que seus vínculos com quaisquer pessoas ou instituições passem a não fazerem mais parte dos arquivos (ou memórias) de qualquer lugar.

É o chamado “direito ao esquecimento”. Segundo a “Folha de S. Paulo” (07.8.2016), tudo começou com pedidos para que ex-inadimplentes deixassem de figurar na rede como ainda devedores. E agora esse direito está virando uma febre no judiciário.

A “Folha” diz ainda que Sofia Costa, 24 anos, questionou à justiça se “ser musa de um time de futebol é um fato que pertence à história do clube ou exclusivamente a quem deteve o título?” Sofia quer que seu nome nunca mais seja vinculado ao clube no qual foi estrela, aos 18 anos, quando tornou-se  musa do Grêmio no Gauchão.

Isso me fez lembrar (ops!) do filme “Brilho eterno de uma noite sem lembranças” (dir. Michel Gondry, 2004) em que há uma empresa especializada em apagar da memória pessoas, coisas, lugares, enfim, tudo. Nele, para terminar um relacionamento e nunca mais ter de lembrar  da pessoa outrora amada, bastaria recorrer aos serviços de desmemória e pronto, estaria dado o “tchau, querido(a)” para sempre.

Lembrei também de Schopenhauer (1788-1860) dizendo que “se a vida e a existência fossem uma condição agradável, todos relutariam em entregar-se ao estado de inconsciência provocado pelo sono”. Dormir, para o filósofo que adorava poodles, era “esquecer” dos abacaxis da vida.  Freud (1856-1939) deu mais cores à essa boutade ao aprofundar o resgate feito pelo sono da condição desagradável da realidade, imputando aos sonhos a satisfação de nossos desejos frustrados. Logo, lembranças, eu diria.

Esquecer é ambivalente: um troço bom e ruim ao mesmo tempo. Lembrar-se do passado para que nunca se repita o malfeito é uma beleza. Mas se for para que o remoamos, é um terror.

Da mesma forma que viver de e no passado é uma fuga. Estar o tempo inteiro “revivendo” aquele tempo que passou, aquele beijo que não volta mais, aquela grana que gastamos à toa, equivale a uma “volta dos que não foram”.

Há ainda as sessões de regressão. Seus apreciadores dizem ser necessário retornar ao útero da mãe e até a vidas passadas. Lá, naqueles lugares tão longínquos da memória, haveria a cura e a resposta para agruras do presente. A conferir.

Em tempos de superexposição lutamos pelo esquecimento, qual o artista que batalha pela fama e depois de consegui-la reclama do assédio de fãs.

O dilema para o direito ao esquecimento é que uma vez apagando seu vínculo com o que quer que seja, sugere a “Folha”, você também estará tentando burlar a história e o direito à informação, às quais cabem, também, registrar os acontecimentos. Mas, e se seu caso for de difamação? Aí a coisa muda de figura.

Portanto, esquecer é preciso. De “precisão” (obrigado, Fernando Pessoa).

A decisão sobre o direito ao olvidamento está na pauta do STF. Em breve teremos uma normatização da questão e todos nós poderemos esquecer e ser esquecidos em diversas instâncias e circunstâncias.

O jornal também informa que uma ex-BBB tem uma ação na justiça pedindo que sejam tiradas da web fotos suas, digamos, sensuais.

É a esquecida pedindo para ser esquecida.

Sergio Marcone Santos é formado em Letras Vernáculas pela UEFS e pós graduando em Comunicação em Mídias Digitais pela Unifacs

*As opiniões emitidas em artigos assinados no site Diário da Notícia são de inteira e única responsabilidade dos seus autores.
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