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Fotos: Divulgação |
Salustiano abraçou a luta dos posseiros e conseguiu assegurar o direito de permanência das famílias ameaçadas na comunidade do Calolé. Não foi uma luta fácil, pois do outro lado, estavam homens poderosos de grande poder econômico e influência política em todo o Nordeste.
Com o direito à terra assegurado, restava para o governo municipal saber o que fazer para transformar a vida daquelas famílias que enfrentavam muitas dificuldades para sobreviver.
Após pesquisas e muitas reuniões com representantes dos posseiros e da prefeitura foi elaborado um plano para a criação de um projeto associativista para o Calolé.
Coordenado por Luis Antônio Costa Araújo, conhecido como Lu Cachoeira, atual provedor da Santa Casa de Cachoeira. Epecialista em planejamento, Lu trouxe para Cachoeira, a experiência vitoriosa do projeto socioeconômico implantado pela CAR- Coordenadoria de Ação Regional- orgão do governo do estado, onde trabalhou até se aposentar - no município de Sobradinho com assentados da Barragem do Sobradinho.
Colaborador da gestão do prefeito Salustiano, também seu genitor, Lu articulou a integração de órgãos do estado, a exemplo da extinta Ematerba- Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural da Bahia, INCRA,CAR e Embrapa- Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, unidade de Cruz das Almas especializada em Mandioca e Fruticultura, dentre outras instituições.
Com mobilização, assistência técnica, suporte financeiro e integração institucionais foi então criado e implantado o "Projeto Cidadão Calolé" que levou para aquela comunidade, esquecida e abandonada, inovações tecnológicas para o manejo e cultivo da terra com ênfase no associativismo. Para isso, atuou uma equipe composta por engenheiros agrônomos, técnicos agrícolas, extensionistas e educadores sociais.
Os ex-posseiros do Calolé que, até então, plantavam em pequenos espaços com técnicas tradicionais sem insumos e individualmente, passaram a trabalhar coletivamente numa área comum.
Foram meses de trabalho intenso com reuniões, viagens para Salvador e Cruz das Almas, mas o projeto saiu do papel para a prática.
A terra foi arada e gradeada com tratores agrícolas e a prefeitura executou melhorias nas estradas vicinais à época intransitável. Ex-posseiros e familiares, que não possuíam nenhum documento, foram encaminhados para se legalizarem e ser reconhecidos como cidadãos de fato e de direito perante a sociedade.
Pesquisas foram realizadas para conhecer as necessidades básicas da comunidade como educação, saúde e moradia, com a finalidade de promover intervenções de melhorias.
Com a terra pronta e a mobilização comunitária foi feito o primeiro plantio coletivo da zona rural de Cachoeira. A cultura escolhida foi de milho com o uso da semente BR, fruto do trabalho científico dos pesquisadores da Embrapa, que garantiu mais qualidade e produtividade do produto.
Toda produção foi comercializada, sem atravessador, diretamente pelos próprios plantadores na Ceasa e Feira de São Joaquim e os lucros repartidos igualitariamente entre os trabalgadores . Depois do milho veio o plantio de quiabo com uma grande safra e o processo de comercialização seguiu o mesmo caminho do milho E assim seguia o projeto. A prefeitura esteve sempre dando apoio e suporte para o sucesso do projeto Cidadão Calolé que durou até o final do mandato do prefeito Salustiano Coelho de Araújo.
Com o final da gestão, o sucessor do ex- prefeito, extinguiu todas as ações do Projeto Cidadão Calolé, considerada a maior iniciativa de reparação do século XX para descendentes de pessoas escravizadas em terras de antigos engenhos de cana de açúcar de Cachoeira no Recôncavo Baiano.
O desmonte do "Projeto Cidadão Calolé", reconhecido agora como área quilombola pelo Governo Federal, aconteceu com a criminalização e espetacularização dos atos com a utilização dos meios de comunicação regional patrocinados pelos responsáveis pela destruição de uma iniciativa pioneira pensada para o desenvolvimento do homem do campo com autonomia e liberdade, a fim de extinguir as amarras do assistencialismo tão arraigado nas gestões populistas.
Com o fim do projeto, até os dias atuais nenhuma ação com a mesma grandiosidade foi realizada na área rural de Cachoeira, mas as orquestrações destruidoras seguem desmontando até mesmo instituições seculares, a exemplo da Santa Casa, Monte Pio dos Artistas Cachoeiranos, Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte e mais recentemente ataques à Sociedade Orpheica Lyra Ceciliana.
*Alzira Costa é jornalista, moradora de Cachoeira, no Recôncavo Baiano.
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