A cartilha para poucos - Por Genaldo de Melo

A cidade de Washington, D.C. é a sede das instituições e órgãos públicos que elaboraram as medidas do Consenso de Washington.
Dois conhecidos meus que votaram com o ex-presidente, por causa do antipetismo disseminado e proselitismo de plantão, falaram-me que o Brasil só deu certo nos governos petistas porque se seguiu a cartilha neoliberal.

Bom, como eles dizem que entendem de economia e como eu não conheço muito sobre o assunto, procurei até ficar calado, mas não consegui. E sem intrigas, coisa que também não é da natureza deles, discordei veementemente da narrativa, porque nunca concordei com o receituário do Consenso de Washington para a América Latina, bem como para o Brasil.

O referido Consenso foi resultado de encontro que aconteceu em novembro de 1989, na capital dos EUA, que reuniu funcionários do governo estadunidense, economistas dos organismos financeiros internacionais ali sediados (FMI, Banco Mundial e BID), e representantes dos governos dos países da América Latina, e que o Banco Mundial saiu com um documento intitulado “Trade Policy in Brazil: the casy for reform” em que rezava para que o Brasil fosse exclusivamente agroexportador.

Como depois do encontro houve na América Latina uma espécie de cooptação de intelectuais e das elites locais, coube a FIESP sair com um documento em agosto de 1990 intitulado “Livre para crescer – Proposta para um Brasil moderno”, em que defendia efusivamente exatamente tal coisa, sugerindo uma agenda de reformas estruturais idêntica à consolidada em Washington.

Se for olhar ao pé da letra, muitas reformas foram feitas começando no governo Collor e se aprofundando no de FHC, dando uma parada nos governos petistas. Mas uma coisa é certa eles conseguiram, pois sucatearam a indústria nacional em nome do agronegócio que deu certo, transformando o país em agroexportador de matérias-primas, melhor dizendo fez o país voltar a ser apenas um país que serve para agricultura de monoculturas assim como foi até os anos 50 do século passado.

Lógico que os conhecidos que me referi no início deste texto, depois de minha exposição continuaram não se convencendo do assunto, pois para eles o Brasil deu certo sim, porque houve um tempo que inclusive o país chegou à sexta economia do mundo. Para eles tudo que falei é coisa da esquerda para impor à população que a direita não presta.

Bom, como tem gente que é difícil de se convencer, porque foi envenenado pelo vírus do antipetismo, procurei não mas discutir com eles, porque entendo que o agronegócio que deu certo, somente deu certo para enriquecer uns poucos latifundiários, que com suas polpudas poupanças, não gerou empregos, porque eles utilizam máquinas e tecnologias de ponta para produzir matérias-primas para exportação, bem como não se distribuiu equitativamente tal riquezas, porque muitos deles tem isenção fiscal do Estado.

Contei toda essa narrativa para terminar com uma reflexão salutar. O Brasil do ponto vista exclusivamente econômico de fato cresceu muito, mas por outro lado o modelo imposto pelo neoliberalismo causou vários problemas no país nos últimos tempos. A concentração das riquezas nas mãos de poucos que não geram empregos, e sucateando os parques industriais de determinadas cadeias produtivas, que geram muito mais empregos, gerou-se problemas sérios e estruturais na sociedade brasileira.

Um dos principais problemas foi que todo o dinheiro que é arrecadado via impostos muito mais da população do que das riquezas das cadeiras produtivas do agronegócio, passou a financiar este setor através de empréstimos do BNDES. Melhor dizendo, o dinheiro do Estado foi mais utilizado para concentração de riquezas nas mãos daqueles que não geram emprego, o que produz desemprego, do que com a possibilidade de empréstimos para aqueles que de fato geram emprego.

Nem o agronegócio e nem as grandes cadeias de economia de escala geram postos de trabalho nesse país. Quem gera os poucos empregos que ainda existem são os pequenos e médios empreendimentos que não tem a possibilidade de acesso ao crédito para crescer.

Como resultado desse receituário neoliberal, ficou ao encargo do Estado ter que prover a grande massa da população com políticas sociais de reparação e de distribuição de renda mínima. E tenho dito reiteradas vezes que com tudo isso aumentou os bolsões de pobreza extrema, e aumentou consideravelmente o número de jovens dentro da população economicamente ativa que desempregada adentra no mundo do crime, das drogas e da violência.

Portanto, discordo veementemente dos meus conhecidos a que referi no início do texto, porque o receituário do Consenso de Washington para o Brasil deu certo, mas deu certo para poucos, e não para o conjunto como um todo da sociedade brasileira. Ou os governos de plantão e o Parlamento brasileiro muda a proposta econômica pensando no povo brasileiro, ou em breve sem sombra de dúvidas teremos catástrofe e distúrbios sociais. 

*Genaldo de Melo é sergipano radicado em Feira de Santana, Gestor social e articulista

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